Friday, August 04, 2006

Sonho acordado


O Pedro tinha dois desejos na vida, o de se tornar um homem independente e outro o de encontrar o verdadeiro amor. Certo dia estava a passear pelo mundo do imaginário, tal como fazia todos os dias, sempre mais ou menos pelas 6 da manhã, hora em que acordava para poder ficar uns minutos a sonhar antes de ter de se levantar para ir trabalhar. Nesse dia o sonho acordado foi diferente, não se limitava a ver um vulto que identificava o seu amor, nesse dia esse vulto, tinha uma forma mais definida, tinha um corpo seu conhecido, tinha mesmo uma cara que sorria e corava.
Pedro estava a sonhar acordado com uma colega, que nem sequer conhecia, trabalhava com ela, mas nunca se tinham falado, exceptuando os habituais olás e bons dias. Pedro lá se levantou e foi tomar um duche, tal como todos os dias, mas nesse dia sentia algu um pouco estranho, uma presença fazia-se sentir perto dele, mesmo ao lado dele no chuveiro. sentia-se observado, mesmo durante o pequeno almoço, uma torrada e uma chávena de chá. No carro, no seu caminho para o emprego, lá estava ela a mulher do seu sonho acordado. Pedro começara a ficar assustado, não era para menos, tinha uma presença que o seguia fosse para onde fosse.
Pedro entrou no emprego e lá estava ela, a mesma presença desse dia, desse bizarro dia que estava a viver. Ele sentia-se bem perto dessa presença, tinha até a sensação que o dia lhe iria correr maravilhosamente, e mesmo há hora de entrar essa presença disse-lhe "bom dia". Seu coração pulou do seu peito em direcção à garganta, deixou de respirar poir uns momentos, ficou angustiado, acordou por momentos do seu sonho acordado, que já se estendia desde que acordou, olhou para o seu lado esquerdo, e lá estava ela, Mariana, a mulher coim quem tem vindo a sonhar acordado desde essa manhã.
Ela estava mesmo ali à sua frente e ele sem conseguir responder ao seu cumprimento. Pedro sentia o estôomago pessado, como se tivesse comido demais de manha, mas não, tinha comido exactamente o mesmo que todos os dias. Sentia, aquilo que vulgarmente chamamos de borboletas no estomago. Mas sentia-se tão bem perto dela que só lhe apetecia envolve-la no seu abraço, mas reteve-se, ela estranhou tal friesa e acariciou-lhe a face, ele quase corou.
Pedro era um rapaz muito simples, muito romântico e tinha sempre resposta na ponta da lingua, mas agora no hora hagá, estava completamente atado aos sentimentos e nada lhe saíra da boca, ficara simplesmente a contemplar a beleza de Mariana. Ela reparou na atrapalhação de Pedro, e como o sentimento era recíproco, sentiu o frio na barriga de Pedro, frio que também sentira desde o primeiro dia que o viu. Chegou-se mais perto e pediu para irem beber um café. Ele aprecebeu-se do convite visto ela não gostar de café. E lá foram os dois, com as mãos dadas em pensamento e no entanto separados e nervosos, pois ambos sabiam que no fim daquele café as suas vidas iriam mudar, mudar do plano imaginário para a realidade. Era assustador para ambos, ambos medrosos davam passos inseguros, mas no entanto sentiam-se felizes, pois sabiam que iriam passar a viver um sonho.

Wednesday, February 01, 2006

nesse sempre


Peguei nos fios destas figuras pequeníssimas e pûs-me a levantá-las e de súbito soltei um som em árabe que as fez tomar forma, corpo e sombra. Rodeámos o teatro e deixei que subissem sem medos. Ofereci-me para lhes agarrar os medos por momentos enquanto se agigantavam nas tábuas que agora rangiam sem interferência de Moliére.
Agarro no sonho e com a mão aberta solto um suspiro, soprando sonhos para dentro das mentes de seres de pau. Soltam risos, gargalhadas vindas da caixa de música onde roda a bailarina vestida de menina.
Terminam o seu espectáculo e esperam aplausos, como quem espera acordar depois de um pesadelo. Têm sede de risos, bravos e aplausos. Descem calmamente as escadas e lentamente com palavras doces de algodão, solto uma explicação gentil sem, no entanto, saber responder à dura e nua questão.
Porque é que não podemos sonhar para sempre?
Não ofereço os medos de volta. Solto-os para o céu negro que guarda os medos de todos nós. Lá ficarão onde melhor os posso deixar.
Não há amanhãs. Sabemos que para aqueles que pairam não há amanhã, ontem, depois de amanhã. Há um eterno sempre. Não há tempo. Somos prova provada que se pode ultrapassar barreiras temporais, como quem voa sobre campos de papoilas ondulantes.
Há vento e sonho. As figurinhas de pau são sete e têm barretes de fantasia para aquecer as suas orelhas frias de duendes.
^para se ver a foto maior e conseguirem ler a oração que aí está escrita basta clicar na imagem^
~na catedral de Winchester a sul de Londres~

Thursday, January 19, 2006

Pedro e Cinderela (Paião)


Pedro era um menino tímido, mas não tanto como a Cinderela. Ele vivia no reino do arco-íris e ela na terra do perlimpimpim, eram vizinhos, cruzavam-se na rua mas nunca falavam.
Certo dia como que por magia, foram na mesma estrela, olharam-se rápidamente, e Pedro sentiu uma enorme vontade de falar à cinderela, encheu-se de coragem, virou-se para ela e disse: “O meu nome é Pedro e o teu qual é?”, ela corou um pouquinho e respondeu baixinho, sou a cinderela.
Nessa noite ao deitar, com a lua a espreitar, e embrulhado na cor vermelha do arco-íris, Pedro sonhou com ela.
Pedro só pensava na Cinderela, e num dia ele andava na lua, no meio da rua e chovia a sério, ela quando lá o viu, encharcado e frio quase o abraçou, e Pedro com a cara toda molhada da chuva, aproveitou, ninguém reparou, ele até chorou.
Agora nos recreios dão os seus passeios, trocam merendas, como quem troca prendas, partilham segredos. Num desses dias, houve sentimentos a falar por si, então ele pegou na mão dela e disse: “Sabes Cinderela, eu gosto de ti”.
Então bate coração, louco de ilusão, a idade assim não tem valor. Crescer, vai dar tempo para aprender, vai dar jeito para viver, o teu primeiro amor...




*História retirada de Cinderela de Carlos Paião*

Thursday, December 29, 2005

Semblantes


Num caminho de terra batida cor de olhos brilhantes, o sol desenhava as formas das árvores numa sombra de sorrisos, frescos como uma brisa de verão. Ao fundo ouviam-se ondas a acariciar as rochas nos penhascos da saudade, e os semblantes com canas de pesca passavam o tempo a falar do passado, e da sua juventude. Diz-se que a crise está à porta, e que a nova geração só pensa em sexo e drogas, e que a vida para eles é só musicas malucas e discotecas e bebidas estranhas, e que nunca virão a ser as pessoas que eles e que os seus pais eram. Dizem os negros vultos do alto do penhasco que é a geração rasca que governa o país, que tudo está mal e que antigamente é que era.
Ideias e ideais à parte, as crianças brincavam num abraço já fechado da noite, à luz dos modernos lampiões eléctricos, aos quais os velhos não se habituam. Elas jogam à bola, e as pedras fazem de balizas, e as mães a ralharem à porta por estarem a jogar com os ténis novos, acabadinhos de comprar, ou com os sapatos que tinham de levar ao casamento da prima da mãe.
E à medida que o sol se escondia por tras do horizonte, aparecia a timida lua, que espreitava o mundo para ver se o caminho estava livre, e se já podia aparecer no meio da escuridão, dando-nos um ar da sua graça e um pouco da luz que roubara ao sol, visto este ter tanta e como não é o Ebenezer Scrooge, ele a partilhava a todos os seres vivos e todos os inanimados, porque ele também nunca pertenceu ao KKK, nem aos arianos puritanos, nem nada parecido.
Vejo isto tudo da minha casa encantada que fica na segunda curva do arco-íris, e vejo muito mais, mas isso é outra história.
*O lobo...*

Thursday, December 15, 2005

(so)nhar


Parece que o sonho nasceu em nós, como nascemos com uma boca, dois olhos e um nariz.
Há uns que passam a vida a sonhar, parece que para esses o sonho é maior que a terra debaixo dos pés ou que o sol depois de um tempo chuvoso. Alimentam-se da esperança que o mal vai passar, que um dia viveremos debaixo do arco-íris com muitas cores por cima das nossas cabeças, como se, de facto, pudessemos colorir a mente apenas com as cores do arco-íris. Apenas com o colorido que se obtem dos sonhos.
Outros afirmam que o sonho é pura ilusão de óptica e não vale a pena passarmos o dia perdidos entre nuvens de algodão doce e pratos de magia servida inesperadamente como gotas de surpresa.
Temos fases. Um dia somos membros acérrimos do clube do sonho, noutra fase somos simplesmente uns valentes cépticos.
Temos mesmo até minutos. Curtos demais para se chamar fases e longos demais para passarem incólumes. Acabamos por querer viver num sonho, mas a realidade dura e cruel bate três vezes como as pancadas de Molière no teatro, e despertamos subitamente sem muito mais que fazer senão levantar a cabeça, lançar um suspiro prolongado no tempo, em sinal de que a reflexão chegou ao fim.
E se nos deixarmos enrolar nas asas da fantasia, é porque acreditamos que a fantasia é uma ave e tem, de facto, asas que nos transportam para onde quisermos. Desafiamos a lei da gravidade e partimos para terras distantes, armados até aos dentes daquilo a que os deuses deram o nome de: sonhos.

Monday, December 05, 2005

O sabor das letras



A vareta do chapéu de chuva partiu-se e tive de atravessar o arco-íris assim nua, com a chuva a bater-me na cara.
Não chovia muito, só o suficiente para molhar a minha cara corada da correria de atravessar este arco-íris.
Corri o mais que os meus sapatos de princesa permitiram, queria muito chegar a tempo de ver o sol nascer.
E ao fundo do horizonte via-se uma luz resplandecente, muito brilhante, muito branca, muito forte, mas que não queimava os olhos.
O sol ia nascendo, como os pequenos passarinhos que vão quebrando a casca para ver os primeiros raios de sol e dizer bom dia ao mundo.
O mundo nem sempre sorri para os passarinhos, como também nem sempre nos sorri a nós, mas os passarinhos
sabem o que fazer e sorriem ao mundo e o mundo sente-se quentinho e não consegue ficar muito tempo com má cara.
Por isso descalcei-me para conseguir acompanhar o sol enquanto se espreguiçava e cheguei ao ninho da árvore velha na esquina do lago dos cisnes e consegui ver como os passarinhos davam os bons-dias ao novo mundo que acabavam de conhecer.
Olhei os passarinhos e sorri-lhes enquanto eles me davam os bons-dias também. Eles estavam muito sorridentes e
disseram-me que a mamã deles tinha ido buscar a papinha e que vinha já. Eu respondi que ficava a tomar conta
deles até ela chegar.
Então aconcheguei-os no meu cachecol feito de algodão doce e deitei-os no colo da mãe
natureza para ela os adormecer enquanto a mãe deles ia buscar alimentos.
Então eles fecharam os seus olhinhos pequeninos e dormiram um soninho. Pareciam bonequinhos de
porcelana, não podiamos mexer muito para não partir, para não estragar. E no fim dormi com eles.
Até que apareceu o meu amor e sorriu-me de longe, eu entrei na linguagem e nos
nossos códigos de sorrisos mágicos de sonhos e de amor e sorri-lhe de volta.
O meu amor tinha me vindo buscar para irmos à terra dos sonhos com ele. Eu disse-lhe que estava a cuidar dos passarinhos e ele sorriu dizendo que a mamã deles estava quase a chegar. e sentou-se ao pé de mim à espera para irmos sonhar juntos.
Quando se gosta, espera-se.
E esperámos os dois. Mais os passarinhos.
Abraçamo-los em nós e deixamo-nos ficar até o sol acabar de abraçar o mundo. Podiamos esperar...o nosso abraço era quente e trazia muita saudade transformada em pózinhos de perlimpimpim para erradiarmos o resto do mundo com o nosso sorriso.
E no meio da magia, e do aconchego, eis que chegou a mãe dos passarinhos. E agradecendo o nosso gesto ofereceu-se para nos levar a um passeio mágico por entre as nuvens, mas nós dissemos para ela levar antes os filhotes que eram muito curiosos e tinham de conhecer tudo. E para mais nós já tinhamos planos.
Queriamos ir ver como era por trás do arco-iris e escorregar, andar a pular entre as nuvens e brincar às escondidas. Queríamos ser livres como os passarinhos e sorrir à lua que entretanto tinha aparecido na nossa frente, para nos mostrar que agora tínhamos mil e uma estrelas a dizer-nos boa noite.
E depois do querer, depois do sonhar vem o fazer, e foi o que fizemos. Cumprimentámos todas as estrelas uma a uma e fomos cear com a lua. Ela estava à nossa espera e preparou-nos um cházinho de tília com umas torradinhas de doce de amora. Depois de tudo ainda comemos uns morangos. E passamos o serão a falar dos sonhos.
Falámos do amanhã e que como não queremos deixar de sonhar juntos, de fazer o amanhã ser o agora e o agora ser já. Não queremos esperar os ciclos lunares nem mesmo os meses a passar no calendário. Mas se eles teimarem em passar, não vamos ter medo, porque sabemos que a lua estará sempre sobre a nossa cabeça e estaremos sempre no abraço contínuo da felicidade.
E é esse abraço que marca as grandes amizades e os grandes amores. E explicámos à lua que ela, juntamente com o sol, os nossos grandes amores, que sem eles não dava para estar alegre ou estar triste, e mesmo quando o céu chora estamos cá nos, pelo menos nós dois a sorrir ou a chorar mas sempre muito felizes por esperar, sempre felizes por nada em especial, e isso torna-nos especiais.
Viajado por Polly Maggoo e Wolf Spirit